Nos últimos anos, um termo de origem inglesa tem ocupado parte dos noticiários do nosso País, notadamente, após a deflagração da Operação Lava Jato e da edição da Lei nº. 12.846/13, mais conhecida como Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa.
Trata-se do termo compliance que tem origem no verbo, em inglês, to comply, que significa agir de acordo com um comando, com as leis, com as normas internas de uma organização, ou seja, estar em compliance, é estar em conformidade com as leis e regras existentes.
Desta maneira, um programa de compliance tem por objetivo manter uma determinada empresa ou entidade, mesmo que pública, em conformidade com as leis vigentes, nos países em que atua, bem como, em conformidade com as suas políticas e procedimentos internos, desde obviamente esses estejam em consonância com a legislação em vigor.
A Lei nº. 12.846/13, sancionada em 1º de agosto de 2013, como resposta aos protestos que eclodiram em meados daquele ano, e que trata da responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, foi um divisor de águas para o compliance no Brasil.
Pela primeira vez, no ordenamento jurídico brasileiro, uma lei ordinária fazia menção expressa a um programa de compliance cujo termo foi traduzido, da língua inglesa, para o português, como “integridade”.
De acordo com o inciso VIII, do Artigo 7º, da aludida Lei, serão levadas em consideração, na esfera administrativa, na aplicação das sanções, com o intuito de reduzi-las,
“a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”. (grifo nosso)
Com as inúmeras irregularidades que surgiram na esteira da Operação Lava Jato e também do Escândalo do Mensalão, as empresas passaram a dar uma maior importância ao desenvolvimento de uma área de compliance efetiva.
Dessa maneira, um assunto que, há pouco mais de cinco anos, encontrava-se circunscrito a setores altamente regulamentados como os setores financeiro, farmacêutico e de seguros, por exemplo, passou a ganhar uma importância cada vez maior em vista do número de empresas processadas e dirigentes presos, inclusive de empresas de projeção internacional, em decorrência da prática de corrupção envolvendo operações com entes públicos.
Um programa de compliance efetivo, cujos requisitos de efetividade encontram-se descritos no Decreto nº. 8.420/15, que regulamentou a Lei nº. 12.846/13, tem o intuito de criar mecanismos internos a fim de evitar que uma empresa incorra em problemas legais e reputacionais, tendo a função última a de proteger o valor da empresa e a de criar um ambiente corporativo mais saudável, justo e transparente.
Esses mecanismos de integridade (ou conformidade) não tem apenas a função de evitar casos de corrupção, mas também evitar, por exemplo, casos de assédio moral, sexual e racismo, que podem surgir no âmbito de uma corporação, assim como reger as relações com outras empresas privadas e com entes públicos em geral.
Em última instância, o compliance é um dos garantidores do livre comércio e do capitalismo em si, uma vez que haverá um claro desequilíbrio entre as empresas caso alguma se utilize de atos de corrupção para vender os seus produtos e serviços no mercado ou a um determinado governo.
De um modo geral, as legislações estrangeiras exigem que as empresas criem estruturas que garantam a boa conduta de seus colaboradores e de seus parceiros comerciais (prestadores de serviços, fornecedores, representantes comerciais, etc).
Nesse sentido, podemos destacar a FCPA – Foreign Corruption Practice Act, promulgada em 1977, nos Estados Unidos, e aplicável às empresas brasileiras que tenham negócios ou conexões com aquele país, e a UK Bribery Act, promulgada em 2010, no Reino Unido.
Como toda ferramenta de controle, o Programa de Compliance nos dá apenas uma razoável segurança de que as leis estão sendo cumpridas dentro de uma dada organização, sendo que a sua adoção não garante por si só que não venham a ocorrer violações. Contudo, o Programa permite, se bem implementado, uma rápida identificação dessas violações e a imediata tomada de providências pela empresa, bem como, a redução de penas, na forma da lei.
Vale ressaltar que os Programas de Compliance não se aplicam apenas a empresas que comercializam com o Poder Público.
De uma forma ou de outra, todas as empresas interagem com o Poder Público quando, por exemplo, do pagamento de tributos, para a obtenção de alvarás e licenças, em uma ação judicial, etc.
Estamos presenciando, nos últimos tempos, que cada vez mais empresas e até mesmo entes da Federação, como, por exemplo, o estado do Rio de Janeiro e o Distrito Federal, estão exigindo que os seus fornecedores ou parceiros de negócios possuam programas de compliance.
Investidores, especialmente os estrangeiros e os grandes investidores nacionais e internacionais, exigem que a empresa receptora do investimento esteja em conformidade com as leis, a fim de evitar potenciais danos financeiros e reputacionais.
A nosso ver, a adoção de mecanismos de compliance efetivos é um caminho sem volta para as empresas.
Trata-se claramente ainda de uma vantagem competitiva frente às empresas que ainda não implementaram tais mecanismos. No entanto, em um curto período de tempo, tornar-se-á uma condição de perpetuação e de manutenção da empresa no mercado.
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Felipe de Almeida Mello é advogado e sócio de BBM Advogados. Consultor jurídico da TheStartupToolbox. Mestre em Direito e especialista em Direito Empresarial. Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), da Escola Superior da Advocacia (ESA/OAB), da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Este conteúdo tem caráter informativo, em caso de questionamento jurídico, entre em contato conosco.
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